domingo, 28 de outubro de 2012

RACISMO E EXCLUSÃO: A CONSTRUÇÃO SOCIAL DO RACISMO NO BRASIL


 
Para iniciarmos nossas reflexões, é necessário fazermos a distinção do significado de três termos, que são normalmente utilizados nas discussões sobre esse tema.

Você sabe o que significa PRECONCEITO, DISCRIMINAÇÃO E RACISMO?

PRECONCEITO: Conceito de opinião formada antecipadamente sem conhecimento dos fatos, julgamento ou opinião formada sem levar em conta os fatos que os contestem. Trata-se de um pré-julgamento, isto é, algo previamente julgado.

DISCRIMINAÇÃO: Separar, distinguir, estabelecer diferenças. A discriminação racial corresponde ao ato de apartar, separar, segregar pessoas consideradas racialmente diferentes, partindo do princípio de que existem raças “superiores” e “inferiores”, o que ficou definitivamente comprovado pela ciência que não existe.

RACISMO: Teoria que sustenta a superioridade de certas raças em relação a outras, preconizando ou não a segregação racial ou até mesmo a extinção de determinada minorias.

De acordo com essas definições, o preconceito está presente na sociedade, mas não necessariamente segrega ou discrimina, já a discriminação promove, baseada em certos preconceitos, a separação de grupos ou pessoas. Por outro lado, o racismo mata, extermina, produz o ódio entre grupos e indivíduos.

A CONSTRUÇÃO SOCIAL DO RACISMO NO BRASIL

A história da sociedade brasileira é marcada pelo racismo. Desde a chegada dos portugueses no século XVI, até o século XX, na pós-abolição, a ideia de inferioridade de algumas raças e da superioridade de outras foi amplamente difundida por intelectuais, políticos, artistas, escritores, jornalistas. A defesa do caráter superior ou inferior de povos, raças ou etnias foi usada em diversos momentos da História como justificativa para o domínio violento de um povo sobre outros e atualmente não encontra nenhum respaldo do pensamento científico. A ideia de que os negros e os indígenas eram inferiores aos brancos europeus, resultou em 400 anos de escravidão negra no Brasil e o extermínio de grande parte da população indígena que aqui vivia muito antes da chegada dos portugueses.

Quando chega o fim da escravidão em 1888, essa ideia ainda permaneceu no cotidiano das pessoas, sendo os negros considerados incapazes e por isso deveriam permanecer realizando trabalhos braçais, pesados, de pouco prestígio na sociedade. Assim, a inserção da população negra no mercado de trabalho após a escravidão não ocorreu, a mão-de-obra foi rapidamente substituída pelos europeus e asiáticos que aqui começaram a chegar no final do século XIX e início do século XX.

O argumento usado pelos brancos europeus de que alguns grupos étnicos eram inferiores a outros, era uma forma de garantir que esses homens que já estavam no poder, continuassem nessa posição. Para isso, tudo que foi relacionado aos povos africanos e indígenas foi considerado ruim, como, por exemplo, as características físicas, cabelo, boca, corpo. As características culturais, religião, organização social passaram a ser motivo de piadas, levando muitas vezes a exclusão social do negro. Ainda hoje, formas sutis de racismo expressam-se em brincadeiras e piadas ofensivas, ou até mesmo em olhares ou frases do tipo “cabelo ruim”, “É negro, mas educado”, “moço pretinho, mas nem parece”, “preto de alma branca”, tal preconceito percebemos até em uma velha marchinha de carnaval bem conhecida que diz “O teu cabelo não nega mulata, porque és mulata na cor, mas como a cor não pega mulata, mulata eu quero teu amor”.

Posturas racistas estão presentes até mesmo entre quem deveria dar exemplos de respeito à diversidade. Recentemente uma professora universitária, com doutorado em Antropologia, e que dá aulas de ciências das religiões afro-brasileiras, chamou um segurança da Universidade Estadual do Pará de “macaco idiota” e “guarda vestido de palhaço”. Grande exemplo de quem diz ser professor, talvez a doutora não tenha estudado o conceito de etnocentrismo, se estudou, tudo não passou de uma teoria que ela passou a reforçar em sua postura “etnocêntrica”. Em outro caso, outro doutor, dessa vez um médico psiquiatra, ofende a funcionária de um cinema em um shopping de Brasília. Entre outras ofensas, o doutor racista disse a jovem que ela “deveria cuidar de orangotangos na África”. Tudo porque o mesmo teria chegado atrasado na sessão de um filme, e queria passar na frente dos outros clientes.   

Sabemos que o fim da escravidão, não trouxe a inclusão social da população negra na saúde, na educação, no mercado de trabalho. Não são assegurados a eles os mesmos direitos dos  brancos. Isso tem se expressado em índices estatísticos de escolaridade de jovens negros que se apresentam inferiores aos dos brancos, também são os negros que recebem os menores salários, possuindo o menor nível de renda, muitos morando nas periferias das grandes cidades.

Dados divulgados pelo mapa da violência 2012, revelam que a violência contra os negros é maior inclusive em relação à taxa de homicídios. Os dados divulgados na pesquisa realizada em todos os Estados brasileiros, mostram que, no Ceará, o número de homicídios entre a população negra em 2010 foi de 1.613, enquanto que na população branca esse número cai consideravelmente, contabilizando 275 homicídios no mesmo ano.

O estudo também faz uma comparação com anos anteriores, mostrando que enquanto as taxas de homicídios entre os brancos vem caindo ao longo dos anos, o número de negros vítimas desse tipo de crime cresceu de forma assustadora. Conforme apontam os dados abaixo:

• Em 2002, o índice nacional de vitimização negra foi de 45,8. Isto é, nesse ano, no país, morreram proporcionalmente 45,8% mais negros do que brancos.
• Quatro anos mais tarde, em 2006, esse índice pula para 82,7 (morrem proporcionalmente 82,7% mais negros do que brancos).
• Já em 2010, um novo patamar preocupante: morrem proporcionalmente 139% mais negros que brancos, isto é, bem acima do dobro!

Tais dados revelam uma verdadeira chaga aberta na realidade social do país, dos quais as maiores vítimas são os negros. Diante disto, faz-se urgente e necessário a elaboração de politicas públicas que garantam a inserção social da população negra, pois além de enfrentarem problemas de baixa escolaridade, sérias condições de pobreza, ainda há uma barreira importante a ser vencida, que é a barreira racial, a barreira que nos faz olhar o negro de forma preconceituosa e inferior. É necessário, portanto, buscarmos desconstruir a visão negativa que a própria sociedade construiu sobre o negro ao longo da história.

A resistência negra diante do racismo e da desigualdade social que dele resulta, sempre existiu. Hoje, ainda com muita luta do movimento negro em todo o país, essa população tem garantido por lei os mesmos direitos que a população branca, lutando para que suas características físicas não seja um fator determinante para definir sua posição social, posto que não é a cor da pele que determina a inferioridade de alguém, essa visão de que alguns são superiores e outros inferiores por conta da “raça” é construída pela própria sociedade, uma sociedade que ainda enxerga o negro como escravo, conforme salientamos. Por outro lado, sabemos que a igualdade de direitos assegurada em lei, também pouco modificou a situação de vida das pessoas negras, que ainda convivem com a desigualdade social e o racismo diariamente.

Por Renata Sobral
  

FONTES:

Luiz Fernandes de Oliveira e Ricardo Cesar Rocha. Sociologia para jovens do século XXI”
Caderno de metodologias de ensino e de pesquisa em sociologia. Iliezi Luciana Fiorelli Silva [et. Al].
Mapa da violência 2012. Disponível em: mapadaviolencia.org.br

INDICAÇOES DE LEITURA E VÍDEO.

FILME “VISTA MINHA PELE” DIREÇÃO: JOEL ZITO ARAÚJO
DOCUMENTÁRIO “A ORIGEM DO HOMEM” (DISCOVERY CHANNEL)

Um comentário:

  1. Excelente texto. É importante abordarmos um aspecto bastante interessante que é o fato do racismo se constituir em crime, no entanto, quase 100% da sociedade brasileira admitir que ele existe. A questão é: os racistas atuam sem a necessidade de mostrar a cara. O sistema já roda sozinho, principalmente o racismo institucional.

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SOBRE A AUTORA: ANA CARMEM AGUIAR RODRIGUES (LICENCIADA EM CIÊNCIAS SOCIAIS, ESPECIALISTA EM ENSINO DE HISTÓRIA DO CEARÁ E ACADÊMICA DO CURSO DE DIREITO PELA UNIVERSIDADE ESTADUAL VALE DO ACARAÚ – UVA. PROFESSORA SUPERVISORA DO PIBIB -SOCIOLOGIA NA ESCOLA DE EEFM MINISTRO JARBAS PASSARINHO EM SOBRAL-CE.) TEMOS COMO OBJETIVO CRIAR UM ESPAÇO VIRTUAL QUE POSSA SER SER COMPARTILHADO POR PROFESSORES, ALUNOS E LICENCIANDOS DE SOCIOLOGIA, PARTIR DA DIVULGAÇÃO DE MATERIAL DIDÁTICO E O DESENVOLVIMENTO DE PESQUISAS, METODOLOGIAS E EXPERIÊNCIAS VOLTADAS PARA A INTERVENÇÃO, MELHORIA E DEFESA DO ENSINO DE SOCIOLOGIA NA EDUCAÇÃO BÁSICA.